Por que repetimos hábitos que nos fazem mal — mesmo sabendo que fazem mal?
Autora: Silviane Silvério
Data: 10 de outubro de 2025
Tempo médio de leitura: 8 minutos
Palavras-chave: neurociência do vício, alívio da dor, tálamo, núcleo paraventricular, autorregulação emocional, ética, autoconhecimento, liberdade, comportamento impulsivo
Resumo
A ciência está revelando que o que chamamos de “falta de força de vontade” muitas vezes é, na verdade, um aprendizado cerebral profundo voltado para o alívio imediato da dor — não para a busca do prazer.
Estudos recentes apontam que o núcleo paraventricular do tálamo registra comportamentos como “soluções” para o sofrimento emocional ou fisiológico, criando laços poderosos que sequestram nossa liberdade de escolha.
Este artigo explora essa dinâmica neurológica, mostra como ela se manifesta em vícios comportamentais (como procrastinação, ruminação e autossabotagem) e oferece estratégias práticas de microregulação para reensinar o cérebro a aliviar sem se ferir.
Desenvolvimento
Você já se perguntou por que, mesmo sabendo que um hábito é prejudicial, você volta a ele como se estivesse sendo puxado por um ímã invisível?
A resposta não está na irracionalidade — está na neurobiologia do alívio.
Pesquisas recentes em neurociência mostram que o cérebro humano não age primariamente por busca de prazer, mas por necessidade urgente de cessar a dor — seja ela física, emocional ou existencial.
Uma região-chave nesse processo é o núcleo paraventricular do tálamo (PVT), que funciona como um “arquivo de emergência” para respostas que aliviam o sofrimento.
Quando uma pessoa bebe álcool, por exemplo, o cérebro não registra apenas “isso é bom”. Ele registra:
“Isso parou a ansiedade, silenciou o vazio, abafou a abstinência. Grave isso com prioridade máxima.”
Esse mecanismo evolutivo foi útil para sobrevivência — mas, em contextos modernos de estresse crônico, ele se transforma em armadilha. O cérebro passa a priorizar qualquer comportamento que prometa alívio imediato, mesmo que cause danos a longo prazo.
E isso não se limita a substâncias. Vícios comportamentais seguem a mesma lógica:
Procrastinação: alivia a ansiedade de começar;
Ruminação: cria a ilusão de controle sobre o caos interno;
Autossabotagem: evita o medo de ser testado ou rejeitado;
Mentira: protege do confronto imediato.
Ou seja: não fazemos porque é bom. Fazemos porque, por alguns instantes, dói menos.
Com o tempo, esse circuito de “alívio agora” abafa a bússola ética. Nossos valores — verdade, responsabilidade, cuidado — não desaparecem, mas são empurrados para o banco de trás, amordaçados pelo barulho do impulso. Não escolhemos o errado porque amamos o erro, mas porque odiamos a dor — e o cérebro aprendeu que essa resposta a silencia.
Conclusão: recuperar a autoria das escolhas
A boa notícia é que o cérebro aprende — e desaprende.
A saída começa com clareza, não com julgamento. E clareza vem de nomear:
Nomeie a dor que está por trás do impulso:
Ansiedade? Vergonha? Solidão? Medo de falhar?
Dar nome à emoção já cria distância entre você e a reação automática.
Substitua o alívio rápido por microtrocas de regulação — gestos pequenos, repetidos, que ensinam ao cérebro um novo caminho:
Respiração 4-4-8: inspire 4s, segure 4s, expire em 8s. Três ciclos.
Regra dos 5 minutos: adie a resposta impulsiva por 5 minutos. O impulso é uma onda — ele passa.
Movimento greve: levante, ande 90 segundos, mude de ambiente. Interrompa o loop.
Escrita sem filtro: 2 minutos de caneta e papel, sem editar. Tire o caos para fora.
Pedido de ajuda: compartilhe com alguém de confiança ou busque suporte profissional.
Reconecte-se aos seus valores:
Verdade: dizer o que é real, mesmo com a garganta seca.
Responsabilidade: assumir o próximo passo possível, mesmo com medo.
Cuidado: consigo e com o outro, mesmo cansado.
Cada repetição dessas escolhas é um voto no tipo de pessoa que você está se tornando. Com o tempo, o cérebro aprende:
“Eu também posso aliviar sem me ferir.”
Vício, em essência, é o sequestro da liberdade pela promessa de alívio imediato.
Recuperar a liberdade é suportar o silêncio entre o impulso e a ação.
É nesse intervalo — pequeno, mas sagrado — que você volta a existir como autor da própria história.
Se seu mundo interno anda barulhento, não se culpe — mas também não se entregue.
Investigue. Nomeie. Respire. Escolha. Repita.
Hoje, faça um gesto pequeno que te aproxima do que você valoriza.
Referências Bibliográficas
Instituto de Pesquisa Scripps. ( 2025 , 7 de outubro). Cientistas descobrem circuito cerebral que aprisiona usuários de álcool no ciclo vicioso do vício. ScienceDaily . Recuperado em 9 de outubro de 2025 de
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Um forte abraço,
Silviane Silvério
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